Era uma vez um lugar árido e cheio
de gente. Uma espécie de seres bem diferentes, mas tão humanos como quaisquer outros.
Grades cercavam as portas e janelas. Ali todos estavam presos. Cumpriam pena, mas
não tinham esse sentimento dentro de si.
No primeiro dia, confesso que
estranhei muito todo aquele universo, mas com o tempo pude perceber que seria
uma grande escola. Que sairia dali, graduada não apenas em Psicologia, mas em
várias formas de ser humano. Passei cerca de dois anos no presídio da cidade,
atendendo presos obedecendo a uma lista de nomes por crime cometido. Todo
atendimento acontecia no segundo andar e o preso vinha caminhando escoltado até
a ponta da escada. Dali para cima era somente eu e ele. Algumas pessoas me
perguntavam se eu sentia medo, estranho, mas esse sentimento me ocorreu apenas
por duas vezes, mas depois conto sobre isso, porque com certeza, vai render
mais uma chuva de história!
Todo preso ficava assentado, de
frente para mim e sempre começava do início: contando sobre seu crime. Eram a
princípio inocentes e injustiçados, mas quando iam adquirindo confiança,
podíamos dizer que o trabalho começava de fato. Ouvi muitas histórias que até
então ficavam muito distantes da realidade que vivia. Armas, drogas, mortes,
tiros. Fui aprendendo sobre outros valores muito diferentes dos meus. Ali pude
viver intensamente a diversidade. E digo com toda propriedade: nunca fui
ameaçada ou desrespeitada. Muito pelo contrário!
Foi nesse tempo que aprendi, de
verdade, sobre valores e ética. Mais que um monte de motivos que te levam a
agir ou um conjunto de regras, percebi que o que vale é a verdade. Por pior que
ela seja e com toda naturalidade do mundo. Ao ponto de, em meio a um dos
atendimentos, ouvir o seguinte relato: “Sou
sequestrador por hobbie. E olha que nunca matei ninguém. Só uma pessoa!” E
nesse momento me senti muito mal por nunca ter matado ninguém... A mágica está
aí: entender as diferenças, sem perder seus valores.
Em tempos de crise política no país fica evidente a crise ética pela qual passamos e como em sua experiência de vida se pôde constatar, bandidos possuem e obedecem seus próprios códigos de ética mais do que a sociedade não criminosa. O sequestrador por hobbie possui valores muito próximos do político que pilha o estado em proveito próprio
ResponderExcluirObrigada pela visita e pelo comentário Mauro!
ResponderExcluir